O caminho é longo - Sustentabilidade das Empresas Brasileiras
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O caminho é longo - Sustentabilidade das Empresas Brasileiras


Por Rafael Tello*

Uma grande distância separa o discurso da prática ambientalmente correta entre as empresas brasileiras. A constatação veio de pesquisa realizada pela Fundação Dom Cabral junto a 172 empresas dos mais variados portes. O estudo apontou que elas estão no que os pesquisadores consideram como sendo o segundo estágio do desenvolvimento ambiental, o que vai pouco além do cumprimento da legislação. O coordenador do estudo, Rafael Tello, aponta quais são os problemas constatados e sugere medidas para serem colocadas em prática a fim de que se passe para um novo patamar de sustentabilidade.

A promoção de um desenvolvimento sustentável no Brasil traz desafios complexos e as empresas precisam estar preparadas para lidar com eles, e com competência para gerar resultados ambientais, econômicos e sociais positivos. Estas estarão aptas a permanecer no mercado e contribuir efetivamente para o desenvolvimento sustentável.



Mas quais empresas estão, de fato, neste estágio avançado de gestão da sustentabilidade? Motivada por esses questionamentos, a pesquisa Estágio da Sustentabilidade das Empresas Brasileiras, realizada em 2012 pelo Núcleo Petrobras de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral, buscou observar o grau de preparação das empresas para atuarem de modo sustentável.

A pesquisa coletou 172 respostas de empresas de todos os portes, presentes em todo o país, por profissionais de diferentes funções. Porém, houve predominância de respostas de grandes empresas, de organizações da Região Sudeste e de diretores e gerentes como respondentes. 

Como já foi dito, a pesquisa avaliou o estágio de desenvolvimento da sustentabilidade corporativa das empresas brasileiras, e como elas estão preparadas (ou não) para atender às demandas de seus diferentes stakeholders (públicos). Os resultados nos permitiram observar as competências desenvolvidas pelas organizações para atuar conforme as premissas da sustentabilidade. Desta forma, o estudo colabora com o processo de desenvolvimento sustentável, indicando caminhos a serem trilhados pelas corporações para que possam evoluir continuamente no seu processo de aprendizado.

Na metodologia, foram definidos cinco estágios de sustentabilidade em que as empresas podem ser classificadas. O nível ideal é o cinco, no qual a sustentabilidade é o negócio da empresa e provoca a mudança no mercado. Na outra ponta, no nível primário, 1, estão as empresas que se limitam ao cumprimento da legislação. Para realizar a classificação das empresas nesses estágios, foram consideradas as seguintes dimensões de análise: conceito de sustentabilidade, intenção estratégica, liderança, estrutura, capacidade de resposta, relacionamento com stakeholders e transparência.

As dimensões mais avançadas nas empresas, segundo a pesquisa, foram o conceito de sustentabilidade adotado e a estruturação interna da sustentabilidade. O primeiro indica que, para gerar resultados positivos no médio e longo prazo, as empresas precisam levar em consideração as demandas de seus stakeholders, ao operar de forma inclusiva e com ética, buscando também diminuir seus impactos ambientais negativos. Na outra dimensão, de estruturação interna da sustentabilidade, a maioria das empresas afirma que a busca pela sustentabilidade é parte de suas políticas, planejamento estratégico e programas de capacitação. Mais de dois terços das respostas indicaram a existência de pessoas ou equipes responsáveis pelo tema.

Nas dimensões restantes, as empresas ainda se encontram em estágios inferiores, revelando que ainda é preciso avançar na incorporação da sustentabilidade em seus negócios.

A pesquisa observou, por exemplo, como as lideranças das empresas se posicionam frente à promoção da sustentabilidade, uma vez que seu apoio é fundamental para a eficácia e a eficiência das iniciativas internas direcionadas ao tema. Metade das empresas não conta com o apoio da liderança (CEO ou conselho) às suas iniciativas, o que indica que ainda há um longo caminho a ser percorrido para o pleno desenvolvimento da sustentabilidade corporativa no Brasil.

Na avaliação da estratégia das empresas frente à sustentabilidade, a pesquisa indica que ela é motivada pela possibilidade de ganhos de reputação e imagem, atendimento das expectativas dos clientes e obtenção de vantagens competitivas. Ela é executada principalmente por meio da oferta de produtos e serviços sustentáveis, especialmente visando à maior eficiência energética.

Na área da transparência, cerca de 60% das empresas já reportam suas iniciativas de sustentabilidade. No entanto, o percentual cai quando se trata de mensuração de impactos socioambientais das atividades corporativas e dos programas específicos, o que compromete a quantidade e a qualidade dos dados apontados nos seus relatórios de sustentabilidade. 

Na dimensão Capacidade de resposta, mais de 66% das empresas confirmaram ter metas e objetivos relacionados à responsabilidade ambiental, a produtos e serviços sustentáveis e à educação de colaboradores. No entanto, 51% dos respondentes não souberam indicar iniciativas priorizadas pela empresa em 2011. Os respondentes também defendem fortemente maior presença corporativa no debate público sobre temas como mudanças climáticas e desigualdade social.

Na avaliação das Relações com stakeholders, aproximadamente metade das empresas atua em parceria com clientes, ONGs e governo, indicando relações construtivas com estes stakeholders. Destacaram-se ações de apoio ao desenvolvimento das comunidades, por meio de contratação e capacitação de habitantes locais, e a oferta de seguro saúde e de capacitação para desenvolvimento profissional.

Em linhas gerais, a conclusão é de que as organizações brasileiras se encontram no segundo estágio de sustentabilidade – estágio engajado –, no qual já há a preocupação de ir além do cumprimento da legislação, buscando reduzir os impactos negativos de suas atividades e tendo no horizonte a melhoria de reputação. No entanto, ainda são muitos os dilemas, elencados a seguir, que impedem as empresas de passarem para estágios mais avançados de sustentabilidade.

Embora haja por parte das empresas o reconhecimento de que a sustentabilidade implica o desempenho em diferentes campos para diferentes atores, ainda falta equilíbrio na importância dada ao tema pelos executivos. Ao tratarmos de sustentabilidade, observamos um viés para o ambiente, comunidades vizinhas e capacitação de colaboradores. Temas relevantes, como a promoção de diversidade e remuneração, são pouco ou raramente tratados. E atores importantes, como acionistas e investidores, têm baixa relevância relativa frente a outros grupos, uma vez que o atendimento de suas necessidades ficou em 11º lugar, entre os 14 componentes do conceito de sustentabilidade. 

Vale ressaltar a clara discrepância entre o discurso e a ação de sustentabilidade das empresas. Há o entendimento do que ela representa, mas 87% dos respondentes concordam que as empresas que divulgam ações de sustentabilidade não estão realmente comprometidas com o tema. 

Outra evidência interessante se verifica nas respostas sobre a motivação para a sustentabilidade. Segundo os respondentes, atuar de forma sustentável é esperado pela sociedade (84%) e traz resultados positivos para a empresa (77%). Contudo, poucos concordam que o tema é mais importante em tempos de crise (46%) e que ele deve ser completamente voluntário (31%). 

Apesar de as empresas apresentarem objetivos corporativos de sustentabilidade e possuírem profissionais para cuidarem do tema, ainda são incipientes as metas para equipes e profissionais. Sem o desdobramento adequado dos objetivos corporativos para os colaboradores não há engajamento, nem compromisso, nem motivação. Isso pode levar à situação na qual a única pessoa responsabilizada por mau desempenho é justamente o profissional da sustentabilidade, sem questionamento de quanto apoio interno ele teve.

A pesquisa mostra que por essas razões, apesar de o país contar com referências mundiais em sustentabilidade, na média, as empresas ainda se encontram em um estágio imediatamente superior à simples busca por cumprimento da legislação.  As empresas chegaram nesse segundo estágio devido à pressão da sociedade e de governos, à existência de empresas que são referência em sustentabilidade no mercado e devido aos profissionais conscientes nas organizações sobre a importância do tema.

Os principais desafios para o avanço da sustentabilidade, apontados na pesquisa, são a maior integração entre ações internas, melhor atendimento das demandas socioambientais e integração do tema na estratégia corporativa. Para superar os desafios, as empresas devem investir em gestão, coordenar ações e alinhá-las ao negócio.

Para terem apoio da liderança, as iniciativas de sustentabilidade precisam gerar resultados econômicos, de preferência com taxas de retorno superiores às de investimentos em outras áreas. Para engajamento e integração dos profissionais frente à sustentabilidade, é preciso que os objetivos corporativos sejam desdobrados para as diferentes áreas, com definição de prioridades conforme capacidade de contribuição para o resultado corporativo.

Se a sustentabilidade for vista como potencial fonte de vantagens competitivas e sua gestão for profissional, as empresas tendem a alcançar estágios mais avançados de sustentabilidade. Neles, terão maior capacidade de desenvolver produtos, serviços e até modelos de negócio, ganhando competitividade e competência para a superação dos desafios cada vez mais complexos enfrentados por nossa sociedade.

Acesse o Relatório completo: "Estágio da Sustentabilidade das Empresas Brasileiras 2012" clique aqui

*Rafael Tello é professor e pesquisador do Núcleo de Sustentabilidade da Fundação Dom Cabral. Colaboraram neste artigo Lucas Amaral Lauriano e Eduarda Carvalhaes, também responsáveis pela pesquisa Estágio da Sustentabilidade das Empresas Brasileiras

Fonte: Estado de Minas



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